É possível pedir a
decretação da falência de uma empresa mesmo sem comprovação de sua insolvência
econômica ou ainda que fique demonstrado que seu patrimônio supera o valor das
dívidas.
Com esse entendimento, a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitiu que tenha
continuidade uma ação de falência contra as Lojas Americanas, ajuizada em razão
de débito de R$ 133 mil que não foi pago na época própria. O valor já foi
depositado, o que afasta a possibilidade de decretação da falência.
As Lojas Americanas
depositaram o valor discutido para se preservar do “desnecessário e vexatório
procedimento falimentar”. Diante do pagamento, o juiz extinguiu o processo sem
resolução de mérito. Porém, na apelação, a sentença foi cassada para que a ação
prosseguisse normalmente.
O Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro (TJRJ) afirmou que não era possível extinguir o feito com o
fundamento de o credor estar utilizando requerimento de falência no lugar da
execução.
Inconformadas com a
decisão do TJRJ, as Lojas Americanas pediram a extinção do feito no STJ.
Alegaram que, por terem realizado o depósito do valor cobrado, a ação deveria
ser considerada improcedente.
Solidez financeira
A empresa acusou o credor
de haver ajuizado a ação de falência exclusivamente para coagi-la a pagar o
débito, usando-a como substituta de ação de cobrança. Entretanto, em virtude de
sua solidez financeira, disse que não seria abalada por um débito de tal valor.
No STJ, o ministro Luis
Felipe Salomão afirmou que não cabe ao Judiciário barrar os pedidos de falência
que observam os critérios estabelecidos em lei, como no caso.
O ministro esclareceu que,
no ordenamento jurídico brasileiro, existem dois sistemas de execução por
concurso universal. O primeiro é o processo de insolvência civil, que se apoia
“no pressuposto da insolvência econômica, que consiste na presença de ativo
deficitário para fazer frente ao passivo do devedor, nos termos do artigo 748
do Código de Processo Civil”.
O segundo é o sistema
falimentar, com base na insolvência jurídica, caracterizada a partir de
situações objetivamente apontadas pelo ordenamento jurídico, como a
impontualidade injustificada, a execução frustrada e a prática de atos de
falência, conforme estabelece o artigo 94 da Lei 11.101/05. Nesse sistema não
há o pressuposto da insolvência econômica, mas ela é presumida nas hipóteses
legais.
Valor mínimo
Salomão lembrou que o
antigo sistema falimentar, disciplinado pelo Decreto-Lei 7.661/45, não
estabelecia valor mínimo para que o credor ajuizasse pedido de falência do
devedor com base na impontualidade injustificada. Segundo ele, esse fato
propiciava pedidos de falência apoiados em valores pequenos, o que não passava
de “mera substituição do processo de execução pelo falimentar”.
Entretanto, o ministro
ressaltou que esse abuso foi combatido com a edição da Lei 11.101, que
estabeleceu o valor de 40 salários mínimos como piso para justificar o pedido
de falência baseado na impontualidade injustificada. Salomão ainda destacou:
“É bem por isso que se mostra possível a decretação de falência independentemente de comprovação da insolvência econômica ou mesmo depois de demonstrado que o patrimônio do devedor supera o valor de suas dívidas”.
Mera cobrança
O ministro afirmou que o
depósito efetuado pelas Lojas Americanas afasta a possibilidade de decretação
da falência da empresa. Porém, reconheceu que a ação precisa prosseguir, “mesmo
que seja sob o rito de mera cobrança”, pois foi fundamentada em hipótese
prevista em lei. Durante o processo poderão, inclusive, ser esclarecidas
questões relativas à exigibilidade das duplicatas, que chegou a ser contestada
pelas Americanas.
O relator disse que, para
a pretensão da empresa de extinguir o processo, é irrelevante seu argumento de
ser uma das maiores do ramo e ter notória solidez financeira. “Há uma presunção
legal de insolvência que beneficia o credor, cabendo ao devedor elidir tal
presunção no curso da ação”, declarou.
Conforme constatou Salomão,
o pedido de falência foi baseado na impontualidade injustificada de títulos que
superam o piso legal de 40 salários mínimos. “Por absoluta presunção legal,
fica afastada a alegação de atalhamento do processo de execução pela via
falimentar”, e, por fim, concluiu o relator:
“Deve a ação prosseguir, mesmo que seja sob o rito de mera cobrança, tendo em vista o depósito elisivo efetuado com o propósito de afastar a possibilidade de decretação da quebra”.
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